Tudo o que mudou com a Resolução BCB 518/2025: “Contas-Bolsão” e nova regra de Capital Mínimo

Tudo o que mudou com a Resolução BCB 518/2025: “Contas-Bolsão” e nova regra de Capital Mínimo

No dia 3 de novembro de 2025, o Banco Central do Brasil (BCB) apresentou duas medidas de grande impacto para o sistema financeiro:

  1. A obrigatoriedade de encerramento das chamadas “contas-bolsão”.
  2. A revisão completa da metodologia de cálculo do capital mínimo exigido de instituições financeiras e de pagamento.

Essas mudanças foram explicadas pelo diretor de Regulação, Otávio Damaso, durante a coletiva de imprensa oficial, e marcam uma nova fase da supervisão do sistema financeiro nacional — mais moderna, proporcional e focada em riscos reais.

🧾 1. O que são “contas-bolsão” e por que o Banco Central decidiu agir

O termo “conta-bolsão” foi usado para definir contas de pagamento ou depósito utilizadas de forma irregular — geralmente para movimentar recursos de terceiros, mascarar beneficiários ou substituir obrigações financeiras, sem a devida autorização regulatória.

Segundo Damaso, esse tipo de uso configura uma prestação de serviços financeiros fora do escopo legal, criando risco de ocultação de identidade e lavagem de dinheiro.

A Resolução BCB nº 518/2025 determina que as instituições:

  • Devem encerrar qualquer conta identificada como de uso irregular.
  • Elaborem critérios próprios de identificação de “contas-bolsão”, podendo usar bases públicas e privadas de dados.
  • Documentem e aprovem esses critérios em nível de diretoria.
  • Mantenham registro das ações por, no mínimo, dois anos, à disposição do Banco Central.

🗓 A regra entra em vigor em 1º de dezembro de 2025.

Damaso destacou que o objetivo é reforçar a integridade do sistema de pagamentos, transferindo para as instituições a responsabilidade de detectar padrões suspeitos. Ou seja, cada fintech, banco ou IP deverá provar que tem controles internos eficazes para evitar esse tipo de conta.

💰 2. A nova metodologia de Capital Mínimo

A segunda parte da coletiva tratou da mudança mais ampla e estrutural: a revisão da regra de capital mínimo.

Damaso lembrou que a base dessa norma foi criada nos anos 1990 e nunca havia passado por revisão completa, mesmo após a explosão de novos modelos financeiros — fintechs, SCDs, IPs, cooperativas e intermediadores digitais.

“O sistema mudou, mas o capital mínimo permaneceu o mesmo. Isso gerou inconsistências e arbitragens regulatórias”, afirmou o diretor.

⚙️ 3. O que muda na prática

De tipo institucional para tipo de atividade

Até agora, o capital mínimo era definido por tipo de instituição (banco, IP, SCD etc.).

A partir de agora, passa a ser definido pelas atividades efetivamente realizadas — o que o BC chamou de modelo ABC (Atividades Baseadas em Capital).

O cálculo passa a considerar:

  1. Custo inicial – despesas tecnológicas e estruturais.
  2. Atividades operacionais – concessão de crédito, intermediação, custódia e serviços.
  3. Captação e investimento – diferencia quem capta recursos de terceiros (maior risco) de quem opera com recursos próprios (menor risco).

🧠 4. Fundamentos econômicos da nova regra

A nova metodologia parte de dois princípios centrais:

  • Cobrir o custo inicial da operação (garantir que a empresa tenha estrutura mínima para começar).
  • Mitigar o risco moral (ex ante) – ou seja, assegurar que os investidores tenham “skin in the game”, comprometendo capital próprio e evitando comportamentos oportunistas.

Segundo Damaso, o novo modelo permite graduar o risco de acordo com a natureza da atividade e definir exigências de capital proporcionais e racionais.

📊 5. Novos valores de capital mínimo

A tabela apresentada pelo Banco Central mostra um aumento expressivo nas exigências, especialmente para Instituições de Pagamento (IPs) e Sociedades de Crédito.

💡 Para IPs, o capital mínimo pode mais que triplicar — um movimento que deve provocar consolidação no setor e elevar o padrão de governança das fintechs.

🕐 6. Período de transição

O BC estabeleceu uma transição de dois anos e meio para que as instituições se adequem:

  • Até 30/06/2026: regra atual.
  • 2º semestre de 2026: 25% da nova exigência.
  • 1º semestre de 2027: 50%.
  • 2º semestre de 2027: 75%.
  • A partir de 01/01/2028: regra nova integral.

Durante a coletiva, Damaso reforçou que o período é suficiente para que as instituições ajustem seus balanços, aportem capital ou redefinam o escopo de atividades.

🧩 7. Impactos esperados

Para o mercado:

  • Redução da arbitragem regulatória: instituições similares terão exigências equivalentes.
  • Maior resiliência sistêmica: capital mais robusto e proporcional ao risco.
  • Ambiente de consolidação: pequenas IPs e fintechs devem buscar fusões ou capital externo.

Para as instituições de pagamento:

  • Exigência de capitalização real e compatível com o volume transacional.
  • Maior necessidade de compliance e governança documental.
  • Supervisão mais intensa sobre operações intermediadas (subadquirentes, BaaS, marketplaces).

Para o Banco Central:

  • Modernização regulatória com base em risco e complexidade.
  • Melhor comparabilidade internacional, aproximando-se das diretrizes de Basileia.

🧭 8. Conclusão

As medidas apresentadas na coletiva de 3 de novembro de 2025 são parte de um movimento de amadurecimento regulatório.

O Banco Central deixa claro que o crescimento do sistema financeiro digital precisa vir acompanhado de estrutura de capital, governança e transparência compatíveis.

Mais do que uma mudança técnica, trata-se de um reposicionamento estratégico do regulador, que passa a tratar fintechs e IPs com o mesmo rigor de bancos — respeitando suas diferenças, mas exigindo responsabilidade proporcional.

Em resumo: o novo marco busca um sistema financeiro mais sólido, transparente e sustentável.